Abas

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Desamadurecer

Tenho algumas inúmeras memórias da minha infância. Dizem que sou tão boa nisso que sempre sirvo de tira teima para os meu amigos. De coisas que aconteceram ano passado, a fatos que rolaram na 1ª série do ensino fundamental. Lembro de cada par de quadrilha e cada viagem de dia das crianças, cada professor e da tesoura sem ponta vermelha que era a única coisa que eu conseguia manter no estojo de um ano pra outro. Mentira, de uma unidade pra outra. Enfim, lembro tudo na ordem e algumas coisas com detalhes de pouca importância. Mas as partes que mais lembro de quando crianças, são os questionamentos. Alguns existenciais e sem resposta demais para a idade, outros que tiveram boas resoluções ao longo do tempo.
Um deles se passou cerca das 17h da tarde na sala de jantar da casa da minha vó Raulinda. Lembro bem da figura de Tio Zé Maria conversando sobre algum fato aleatório com meu pai e outros membros da família. Aleatório porque com 6 anos você não presta atenção nas conversas de adulto. E o meu questionamento vinha justo daí: Como que os adultos conseguiam ser felizes sem brincar? E ali, recém entediada pela falta de crianças na casa eu comecei a listar as coisas que, na minha visão, faziam os adultos felizes. Conversar. É isso que eles curtem fazer. Mas como conseguiam estar sentados ali, gesticulando mãos desocupadas de brinquedos, há mais de 2h, tomando café preto? Como eles conseguiam tomar café preto? Depois daquele levantamento comecei a fazer o meu laboratório. Experimentei “conversar”. Não era bom. Só funcionavam com as minhas bonecas que traçavam diálogos como: “amiga, você vai pra roça de vovô João esse final de semana?”. Tão imaturas aquelas barbies que aparentavam 20 e tinha papo de 6. 
Dalí em diante, ao longo do meu crescimento, existiram momentos em que eu me percebia participando de diálogos mais compridos. Aos 9 eu disse pra minha mãe: acho que estou numa fase mais inteligente. Ela não deve lembrar, pois a memória de elefante é minha, mas me revivo claramente esse meu insight de maturidade.
Hoje, aos 22, adulta (nem tanto), fico muito invocada com a capacidade que tinha, como criança, de ficar tanto tempo submersa brincando de boneca, casinha, entre outras atividades que exigem criatividade e o principal: concentração. Falo porque lembro que essa atividade exigia um pouco do “sentir” tudo aquilo tudo que se inventava. Cozinhar folhas numa panelinha sem fogo e fazer barulho de mastigação sem nada na boca é um nível de imersão que perdemos a capacidade de viver. 
Não sei em que momento ficamos tão sérios, não sei se foi quando aprendemos a conversar sobre as coisas reais ou quando passamos a viver as coisas que encenávamos. Não sei. Se soube um dia, dessa parte eu não lembro.