2018 foi o ano do vai com medo mesmo.
Dei minha primeira aula de violão com medo
Entrei no mar mais vezes com medo
Peguei uber de madrugada com medo
Larguei o meu emprego com medo
Voltei a estudar com medo
Beijei a curva do rosto com medo
Dancei forró na rua com medo
Conheci o amor com medo
Abri o jogo em casa com medo
Entrei na terapia com medo
Aceitei o fim com medo
Usei meu primeiro maiô com medo
Fui sozinha pro rolê com medo
Paguei pra ver com medo
Escrevi isso aqui com medo
O nome disso é coragem, 2019.
quinta-feira, 20 de dezembro de 2018
terça-feira, 27 de novembro de 2018
Assovio
Assoviar pra mim era como andar de bicicleta: algo que todo mundo aprenderia. Como um marco mesmo, algo natural, como a chegada da puberdade ou a primeira menstruação. Se bem que naquela época eu não sabia o que era menstruação. Aprendi primeiro a asssoviar. Não lembro exatamente em qual pedaço da infância, mas não foi muito tarde. Realizava, enfim, o sonho do instrumento próprio. Algo pra chamar de meu. Eu tinha o meu assovio. E eu assoviava tudo. Vovô proibiu de assoviar de noite. Eu não queria ser responsável por chamar as cobras. Me contive. Até hoje meu pai me reclama quando assovio. Ele diz que é sinal de ansiedade. Já brigamos sério por causa disso e eu continuou assoviando quando fico agitada. Hoje eu tive vontade de assoviar no meio de uma reunião de trabalho, dentro do uber, na sessão de terapia. Talvez meu pai esteja certo, mas a censura dele também me faz respirar com dificuldade. Assoviar faz mais bem que mal, aposto. É colocar o de dentro pra fora em forma de música. Faz mais bem que mal, aposto alto.
[assovie sua música favorita aqui]
segunda-feira, 19 de novembro de 2018
sexta-feira, 16 de novembro de 2018
Lembro muito dos momentos de desabafo de uma das minhas professoras do ensino fundamental. Quando a turma já não deixava um fio de silêncio sobrar ela relaxava a testa e endurecia a boca em palavras ainda mais duras. Mas antes disso, ela abandonava o quadro e, sentada na mesa, esperava de cada aluno fosse se tocando da sua ausência ali, estátua. Ela começava sempre com:
vocês não tem noção de como a vida é difícil
Era uma estratégia manjada que entrava surda em nossos ouvidos de criança. Mas num dia especifico suas palavras de sempre me chamaram a atenção de nunca. O que será esse difícil que ela tanto fala? Será dinheiro? Filhos? Perder nossos pais? Ela nos dava ali um spoiller inútil sobre a vida. Inútil não só porque a gente não ligava. É que tem coisas que só sentindo na pele. Aquela pele de criança já sofria, mas não dessas misteriosas demandas da maturidade. Mas apesar de tudo, naquele dia eu me concentrei na certeza de que ela tinha razão. Ela era adulta e já tinha problemas reais. Eu guardei aquele recado e por muitas vezes eu pensei: há de chegar o dia em que a vida vai apertar, eu vou resolver numa boa e eu vou lembrar que minha professora na real só não sabia lidar com os problemas.
Pró, desculpa. Você tinha toda razão, mas não ia adiantar muita coisa prestar mais atenção do que eu prestei no seu discurso. É que viver a vida é de fato aquele clichê dos bando de degrau. E que um leva pro outro. E a gente vai subindo e subindo, crescendo e crescendo. Vez em quando a gente é obrigado a subir dois, três de uma vez. Dá um trabalhão. Mas, conseguindo, a gente chega ainda mais alto. Me desculpa por ter sido um degrau difícil nas suas aulas. Eu realmente conversava pra caralho. Bem provável que em relação ao domínio da sala você esteja nesse mesmo degrau até hoje, afinal, os alunos estão cada vez mais difíceis. Mas liga não, aqui da vida adulta eu te garanto, uma hora a gente sente na pele.
sexta-feira, 9 de novembro de 2018
terça-feira, 6 de novembro de 2018
água
Zé disse que eu sou água.
Eu achei isso a coisa mais linda de se ouvir.
Zé disse que eu sou muita água.
Eu me senti um banho.
Me senti um lago morno.
Lago não. Eu não sou água parada.
Mas também não sou mar.
Sou água doce.
Que oscila menos que maré.
Sou guiada por fenômenos mais cumpridos e barulhentos.
Como chuva de trovão.
Acho que sou rio.
Acho que sou rio.
segunda-feira, 5 de novembro de 2018
sábado, 27 de outubro de 2018
Quando Deus criou a casa que habita a alma, ele sabia que os olhos seriam janelas escancaradas. Deus podia prever tudo. Eu, imagem e semelhança, não posso. Então circulo com esses pares de verdades encaixados no rosto, deixando claro na íris os desejos mais e menos profundos. Meus pares não mentem e Deus sabia dessa sinceridade desde o início. Deus é mó danado. Acho até que ele enxerga mais cores que eu.
quarta-feira, 24 de outubro de 2018
Paciência
Casulo não abre
se ansiosa a matéria
é que nem tudo é matéria
Pensamento é exemplo
tipo de vento
Dessas forças de não ver
A consciência da metamorfose
Só existe amanhã
E amanhã nem existe ainda
se ansiosa a matéria
é que nem tudo é matéria
Pensamento é exemplo
tipo de vento
Dessas forças de não ver
A consciência da metamorfose
Só existe amanhã
E amanhã nem existe ainda
terça-feira, 16 de outubro de 2018
quarta-feira, 10 de outubro de 2018
terça-feira, 9 de outubro de 2018
quarta-feira, 26 de setembro de 2018
Choro seco
Nas terras onde não chove,
o vento faz curvas melódicas.
As terras rachadas também choram.
Choro seco
Arranha
Mas alivia.
Lá choro é vento
Vento que atravessa atrito os espinhos de mandacaru
soltando assobios
soltando assobios
em melodia menor
em lamento.
Por isso alivia.
males espanta
cantar é quase chorar.
males espanta
cantar é quase chorar.
Falo da seca que eu conheço.
Mas pelo resto do mundo deve ser igual
A natureza dá seu jeito de desaguar
sábado, 22 de setembro de 2018
segunda-feira, 17 de setembro de 2018
sexta-feira, 14 de setembro de 2018
banho maria
A paciência cozinha em banho maria as minhas decisões
coloca no juri sensações e reações e
gasta um gás
Mas a paciência mantém meu corpo sob uma temperatura aturável
continuo quente
e atenta
E o vapor
me faz flutuar
acredite
acredite
no meu próprio céu
quinta-feira, 6 de setembro de 2018
Agosto
Minha crença no tempo
coagida a existir
Sem permissão pra teimar
Escolheu, por obrigação, existir
É que ele não pede pra passar
Imponente, mal trisca o chão
não olha pro lado
Leva sem mostrar a direção
carrega a contra-gosto
e a gosto, se a gente deixar.
doutrinavam em meu ouvido:
sentimento é só matéria
Ah, eu teimei que não.
Falei que amor é impalpável
coisa de outra dimensão.
Tempo me bronqueou
falou que eu nada entendia de dimensão
mas que ele ia passar mesmo assim
que eu me resolvesse
sentindo o que tivesse de sentir
Isso é pra quem sabe o que está fazendo.
O tempo sabe.
*
Os fiéis do tempo*
doutrinavam em meu ouvido:
sentimento é só matéria
Ah, eu teimei que não.
Falei que amor é impalpável
coisa de outra dimensão.
Tempo me bronqueou
falou que eu nada entendia de dimensão
mas que ele ia passar mesmo assim
que eu me resolvesse
sentindo o que tivesse de sentir
Isso é pra quem sabe o que está fazendo.
E o tempo acredita em mim.
quarta-feira, 29 de agosto de 2018
segunda-feira, 13 de agosto de 2018
terça-feira, 7 de agosto de 2018
Árabe
Já havia provado de tudo
Sabia que açúcar lhe amaciava os ânimos
E que o azedo lhe acumulava a saliva
Que o apimentado das bocas lhe fazia cócegas pelo resto do corpo
E que o salgado do mar lhe ardia os olhos
Sempre se perguntou se ainda existia uma sensação inédita
Até o dia que provou a dois do mesmo prato.
Sabia que açúcar lhe amaciava os ânimos
E que o azedo lhe acumulava a saliva
Que o apimentado das bocas lhe fazia cócegas pelo resto do corpo
E que o salgado do mar lhe ardia os olhos
Sempre se perguntou se ainda existia uma sensação inédita
Até o dia que provou a dois do mesmo prato.
quinta-feira, 12 de julho de 2018
quarta-feira, 27 de junho de 2018
terça-feira, 3 de abril de 2018
quarta-feira, 21 de março de 2018
quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018
terça-feira, 9 de janeiro de 2018
Desamadurecer
Tenho algumas inúmeras memórias da minha infância. Dizem que sou tão boa nisso que sempre sirvo de tira teima para os meu amigos. De coisas que aconteceram ano passado, a fatos que rolaram na 1ª série do ensino fundamental. Lembro de cada par de quadrilha e cada viagem de dia das crianças, cada professor e da tesoura sem ponta vermelha que era a única coisa que eu conseguia manter no estojo de um ano pra outro. Mentira, de uma unidade pra outra. Enfim, lembro tudo na ordem e algumas coisas com detalhes de pouca importância. Mas as partes que mais lembro de quando crianças, são os questionamentos. Alguns existenciais e sem resposta demais para a idade, outros que tiveram boas resoluções ao longo do tempo.
Um deles se passou cerca das 17h da tarde na sala de jantar da casa da minha vó Raulinda. Lembro bem da figura de Tio Zé Maria conversando sobre algum fato aleatório com meu pai e outros membros da família. Aleatório porque com 6 anos você não presta atenção nas conversas de adulto. E o meu questionamento vinha justo daí: Como que os adultos conseguiam ser felizes sem brincar? E ali, recém entediada pela falta de crianças na casa eu comecei a listar as coisas que, na minha visão, faziam os adultos felizes. Conversar. É isso que eles curtem fazer. Mas como conseguiam estar sentados ali, gesticulando mãos desocupadas de brinquedos, há mais de 2h, tomando café preto? Como eles conseguiam tomar café preto? Depois daquele levantamento comecei a fazer o meu laboratório. Experimentei “conversar”. Não era bom. Só funcionavam com as minhas bonecas que traçavam diálogos como: “amiga, você vai pra roça de vovô João esse final de semana?”. Tão imaturas aquelas barbies que aparentavam 20 e tinha papo de 6.
Dalí em diante, ao longo do meu crescimento, existiram momentos em que eu me percebia participando de diálogos mais compridos. Aos 9 eu disse pra minha mãe: acho que estou numa fase mais inteligente. Ela não deve lembrar, pois a memória de elefante é minha, mas me revivo claramente esse meu insight de maturidade.
Hoje, aos 22, adulta (nem tanto), fico muito invocada com a capacidade que tinha, como criança, de ficar tanto tempo submersa brincando de boneca, casinha, entre outras atividades que exigem criatividade e o principal: concentração. Falo porque lembro que essa atividade exigia um pouco do “sentir” tudo aquilo tudo que se inventava. Cozinhar folhas numa panelinha sem fogo e fazer barulho de mastigação sem nada na boca é um nível de imersão que perdemos a capacidade de viver.
Não sei em que momento ficamos tão sérios, não sei se foi quando aprendemos a conversar sobre as coisas reais ou quando passamos a viver as coisas que encenávamos. Não sei. Se soube um dia, dessa parte eu não lembro.
Um deles se passou cerca das 17h da tarde na sala de jantar da casa da minha vó Raulinda. Lembro bem da figura de Tio Zé Maria conversando sobre algum fato aleatório com meu pai e outros membros da família. Aleatório porque com 6 anos você não presta atenção nas conversas de adulto. E o meu questionamento vinha justo daí: Como que os adultos conseguiam ser felizes sem brincar? E ali, recém entediada pela falta de crianças na casa eu comecei a listar as coisas que, na minha visão, faziam os adultos felizes. Conversar. É isso que eles curtem fazer. Mas como conseguiam estar sentados ali, gesticulando mãos desocupadas de brinquedos, há mais de 2h, tomando café preto? Como eles conseguiam tomar café preto? Depois daquele levantamento comecei a fazer o meu laboratório. Experimentei “conversar”. Não era bom. Só funcionavam com as minhas bonecas que traçavam diálogos como: “amiga, você vai pra roça de vovô João esse final de semana?”. Tão imaturas aquelas barbies que aparentavam 20 e tinha papo de 6.
Dalí em diante, ao longo do meu crescimento, existiram momentos em que eu me percebia participando de diálogos mais compridos. Aos 9 eu disse pra minha mãe: acho que estou numa fase mais inteligente. Ela não deve lembrar, pois a memória de elefante é minha, mas me revivo claramente esse meu insight de maturidade.
Hoje, aos 22, adulta (nem tanto), fico muito invocada com a capacidade que tinha, como criança, de ficar tanto tempo submersa brincando de boneca, casinha, entre outras atividades que exigem criatividade e o principal: concentração. Falo porque lembro que essa atividade exigia um pouco do “sentir” tudo aquilo tudo que se inventava. Cozinhar folhas numa panelinha sem fogo e fazer barulho de mastigação sem nada na boca é um nível de imersão que perdemos a capacidade de viver.
Não sei em que momento ficamos tão sérios, não sei se foi quando aprendemos a conversar sobre as coisas reais ou quando passamos a viver as coisas que encenávamos. Não sei. Se soube um dia, dessa parte eu não lembro.
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